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Foi uma quarta-feira que apresentou o pior de nós. Na Argentina, a selvageria das arquibancadas terminou em pancadaria, correria e jogo cancelado. No Brasil, o preconceito se fez presente: logo após a eliminação do Inter, Roger Machado foi alvo de ataques racistas nas redes sociais. Dois episódios distintos, mas unidos por uma mesma marca: a incapacidade de o esporte servir como espaço de convivência civilizada. Não é de hoje que o futebol expõe nossas fraturas. No caso de Roger, o crime do racismo se repete com a frieza da reincidência. Não importa o clube: Inter, Grêmio, Flamengo ou qualquer outro, a cor da pele ainda é usada como munição covarde. Como lembra meu amigo Marcelo Carvalho, do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, "o preto não pode errar nunca". E muitas vezes, nem precisa errar para ser atacado. A cena não é isolada. Na Inglaterra, Jess Carter já confessou ter protegido Lauren James porque sabia que, se fosse a única a errar um pênalti na Euro, "o racismo que viria seria astronômico". Na Alemanha, a federação abriu investigação depois que jogadores pretos foram alvo de insultos racistas nas arquibancadas da Copa da Alemanha. Se falhar no esporte já é difícil, para atletas negros é muito pior. Do outro lado do continente, a violência que tomou conta de uma partida na Argentina mostra outro sintoma: a incapacidade de conter a barbárie. O estádio, que deveria ser um espaço de festa, virou campo de batalha. O futebol, que deveria abraçar, não afastar; agregar, não segregar, segue sendo um ambiente fértil para o que temos de pior. É por isso que essa luta exige ação conjunta. Ao Estado, cabe identificar, julgar e punir com rigor os responsáveis. Ao esporte, identificar e banir dos estádios quem insiste em alimentar o ódio (a eliminação dos clubes também deve ser simbólica e exemplar). À sociedade, cobrar por um mundo melhor, onde a paixão pelo jogo não seja desculpa para a barbárie. A derrota dentro do campo nunca é a mais dolorosa. A derrota civilizatória é sempre mais cruel. .