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Costumo dizer com uma frequência possivelmente irritante que duas coisas podem ser verdade ao mesmo tempo. No assunto em questão aqui: o Bahia mereceu vencer o Palmeiras e o gramado estava em péssimas condições. Ou ainda: gramados naturais podem ser medonhos e os sintéticos, longe do ideal. Abel Ferreira reclamou do que encontrou em Salvador. Rogério Ceni rebateu: "Acho que a cor (do gramado) estava muito feia. Para o Palmeiras, é melhor gramado ruim porque só fazem ligação direta, quase. A característica de jogo deles é Weverton-Flaco-Vitor Roque. A gente se prejudica mais porque joga desde trás no chão. Também gostaríamos que o gramado tivesse em melhor condição, mas acho que atrapalhou mais para nós. Sobre lesão, me desculpa, mas para quem joga em gramado sintético reclamar de lesão em gramado natural, aí fica feio. Não é o ideal? Concordo. Mas lesão muscular na conta do gramado é demais." Na súmula, o árbitro Anderson Daronco observou mais do que a aparência estética: "Informo que o gramado do estádio arena fonte nova não apresentava boas condições para a prática do futebol estando em estado regular. Relato também que o gramado apresentou praticamente em sua totalidade muita tinta na cor verde para cobrir suas imperfeições." O fato de que o Brasil vive hoje a disputa gramado natural ruim versus gramado sintético é um problema seríssimo. Transformar isso em uma disputa nós (pessoal do gramado ruim e esburacado) versus eles (pessoal do gramado sintético mais ou menos decente) é estúpido. Ninguém ganha. O técnico do Bahia, no entanto, foi além. Buscou diminuir o adversário tática e tecnicamente, reduzindo seus recursos a ligações diretas entre o goleiro e a dupla de atacantes. Seria difícil imaginar um time tão bem-sucedido com apenas um tipo de jogada, mas neste caso a análise simplesmente não conversa com a realidade. Na partida contra o Fortaleza (que Ceni conhece tão bem), por exemplo, os quatro gols alviverdes foram marcados por Raphael Veiga, Ramón Sosa e Andreas Pereira — os dois últimos quando Flaco e Roque já estavam em campo. Gustavo Gómez abriu o placar no Monumental, contra o River, em escanteio batido por Andreas. O zagueiro artilheiro também marcou contra o Sport e Lucas Evangelista, contra o Inter. O volante, aliás, foi um dos destaques da partida de volta contra os argentinos, que garantiu a classificação às semis da Libertadores. Ignorar os jogadores que citei, as ótimas temporadas de Khellven e Piquerez, e a importância de homens como Aníbal Moreno e Felipe Anderson no elenco é equivocado e, se me permitem esticar a corda, pouco inteligente. O treinador valorizaria mais o feito de seus comandados e seu próprio trabalho se não tentasse diminuir um oponente que é indiscutivelmente melhor. Perdeu, inclusive, grande oportunidade de lutar com mais força por um gramado em melhores condições — o mínimo considerando a riqueza dos donos da SAF tricolor. Ou pelo menos de manter a coerência, depois de dizer em 2024 que preferia atuar no sintético do que em um gramado naquelas condições. Ceni preferiu espezinhar. Acontece nas melhores rivalidades. Siga Alicia Klein no Se inscreva no canal de Alicia Klein e Milly Lacombe no Assine a